Descrição de chapéu The New York Times Chumbo, provavelmente de vinho barato, pode desvendar mistério sobre surdez de Beethoven Cientistas encontraram quantidades impressionantes dessa substância em fios de cabelo do compositor
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8.mai.2024 às 11h03 Atualizado: 8.mai.2024 às 12h35

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Gina Kolata The New York Times

Às 19h do dia 7 de maio de 1824, Ludwig van Beethoven, então com 53 anos, entrou no palco do Teatro de Kärntnertor, em Viena, para ajudar a conduzir a estreia mundial de sua Nona Sinfonia, a última que ele completaria.

Essa apresentação, cujo 200º aniversário ocorreu nesta terça (7), foi inesquecível de muitas maneiras. Mas também foi marcada por um incidente no início do segundo movimento que revelou à plateia de cerca de 1.800 pessoas quão surdo o compositor estava.

Ted Albrecht, professor emérito de musicologia na Universidade Estadual de Kent, em Ohio, e autor de um livro recente sobre a Nona Sinfonia, descreveu a cena.

O movimento começou com tambores altos, e a multidão aplaudiu freneticamente.

Beethoven, porém, estava alheio aos aplausos e à sua música. Ele ficou de costas para a plateia, batendo o tempo. Naquele momento, um solista segurou a manga dele e o virou para que visse a adulação barulhenta que não podia ouvir.

Foi mais uma humilhação para um compositor que havia sido envergonhado por sua surdez desde que começou a perder a audição aos 20 anos.

Mas por que ele ficou surdo? E por que foi atormentado por cólicas abdominais incessantes, flatulência e diarreia?

Fãs e especialistas já discutiram várias teorias. Seria a doença de Paget nos ossos, que no crânio pode afetar a audição? Será que a síndrome do intestino irritável causou seus problemas gastrointestinais? Ou ele poderia ter tido sífilis, pancreatite, diabetes ou necrose papilar renal, uma doença renal?

Após 200 anos, uma descoberta de substâncias tóxicas em mechas de cabelo do compositor pode, enfim, resolver o mistério.

Essa história em particular começou alguns anos atrás, quando pesquisadores perceberam que a análise de DNA havia avançado o suficiente para justificar um exame do cabelo que teria sido cortado da cabeça de Beethoven por fãs enquanto ele agonizava.

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William Meredith, diretor fundador do Centro Ira F. Brilliant para Estudos de Beethoven na Universidade Estadual de San Jose, começou a procurar mechas em leilões e em museus. Eventualmente, ele e seus colegas encontraram cinco, que foram confirmadas por uma análise de DNA como sendo provenientes da cabeça do compositor.

Kevin Brown, apaixonado por Beethoven, tinha três das mechas e queria honrar o pedido de Beethoven em 1802 de que, quando morresse, os médicos tentassem descobrir por que ele estava tão doente. O empresário australiano enviou duas mechas para um laboratório especializado na Clínica Mayo, dona de equipamento e expertise para testar metais pesados.

O resultado, disse Paul Jannetto, diretor do laboratório, foi impressionante. Uma das mechas apresentava 258 microgramas de chumbo por grama de cabelo, e a outra, 380 microgramas.

Um nível normal de chumbo no cabelo é inferior a 4 microgramas por grama.

“Isso mostra que Beethoven foi exposto a altas concentrações de chumbo”, disse Jannetto. “Esses são os valores mais altos em cabelo que já vi”, acrescentou. “Recebemos amostras de todo o mundo, e esses valores estão em uma ordem de magnitude maior.”

O cabelo de Beethoven também continha níveis de arsênico 13 vezes acima do normal e níveis de mercúrio que eram quatro vezes a quantidade normal.

Mas são as altas quantidades de chumbo que poderiam ter causado muitos de seus problemas de saúde, afirmou Jannetto.

Os investigadores, incluindo Jannetto, Brown e Meredith, descrevem seus achados em uma carta publicada na última segunda (7) no jornal Clinical Chemistry.

A análise atualiza um relatório do ano passado, quando a mesma equipe disse que Beethoven não tinha envenenamento por chumbo. Agora, com testes minuciosos, afirmam que ele tinha chumbo suficiente em seu sistema para, no mínimo, explicar sua surdez e doenças.

David Eaton, toxicologista e professor emérito da Universidade de Washington que não estava envolvido no estudo, disse que os problemas gastrointestinais de Beethoven “são completamente consistentes com envenenamento por chumbo”. Quanto à surdez, ele afirmou que altas doses de chumbo afetam o sistema nervoso e poderiam ter destruído sua audição.

“Se a dose crônica foi suficiente para matá-lo, é difícil dizer”, acrescentou Eaton.

Ninguém está sugerindo que o compositor tenha sido envenenado deliberadamente. No entanto, Jerome Nriagu, especialista em envenenamento por chumbo na história e professor emérito na Universidade de Michigan, disse que o chumbo foi usado em vinhos e alimentos na Europa do século 19, assim como em medicamentos e pomadas.

Uma fonte provável dos altos níveis de chumbo de Beethoven era o vinho barato. O chumbo, na forma de acetato de chumbo, também chamado de “açúcar de chumbo”, tem um sabor doce. Na época do compositor, era frequentemente adicionado a vinhos de baixa qualidade para melhorar o sabor.

O vinho também era fermentado em caldeiras soldadas com chumbo, que se soltava à medida que o vinho envelhecia, disse Nriagu. Além disso, as rolhas das garrafas de vinho eram embebidas em sal de chumbo para melhorar a vedação.

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Beethoven consumia cerca de uma garrafa de vinho por dia, e mais tarde em sua vida ainda mais, acreditando que a bebida era benéfica para sua saúde e também, segundo Meredith, porque se viciara nela. Nos últimos dias antes de sua morte aos 56 anos em 1827, seus amigos lhe davam vinho a colheradas.

Quando tinha 32 anos, Beethoven lamentou que não podia ouvir uma flauta ou um pastor cantando, o que, escreveu, “quase me levou ao desespero. Um pouco mais e eu teria cometido suicídio —apenas a arte me segurou. Ah, parecia impensável deixar o mundo até que eu tivesse trazido tudo o que sinto que está dentro de mim.”

Ao longo dos anos, Beethoven consultou muitos médicos, tentando tratamento após tratamento para suas doenças e sua surdez, contudo não encontrou alívio. Em um ponto, ele estava usando pomadas e tomando 75 medicamentos, muitos dos quais provavelmente continham chumbo.

Em 1823, ele escreveu a um conhecido, também surdo, sobre sua própria incapacidade de ouvir, chamando-a de “uma grande desgraça” e observando: “os médicos sabem pouco; finalmente se cansa deles”.

Sua Nona Sinfonia provavelmente foi uma forma de reconciliar sua tristeza com sua arte.

Desde a adolescência, Beethoven havia sido cativado por um poema, “Ode à Alegria”, de Friedrich Schiller.

Ele musicou o poema na Nona, cantado por solistas e um coro —considerado o primeiro caso de canto em uma sinfonia. Foi a culminação da sinfonia, retratando uma busca pela alegria.

O primeiro movimento é uma representação do desespero, escreveu Beethoven. O segundo movimento, com seus tambores altos, é uma tentativa de superar o desespero. O terceiro revela um mundo “terno” onde o desespero é deixado de lado, escreveu Beethoven. Mas deixar de lado o desespero não era suficiente, concluiu. Em vez disso, “deve-se procurar algo que nos chame para a vida”.

O final, o quarto movimento, era esse chamado. Era a Ode à Alegria.

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